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David Bowie, gravando seu vídeo para Rebel Rebel no AVRO's TopPop (Dutch television show) em 1974

David Bowie tem uma carreira tão longa quanto versátil: são mais de 30 álbuns de estúdio, incluindo trilhas sonoras, singles perdidos, duetos valiosos (com John Lennon, Freddie Mercury) e uma vontade imensa de alterar as estruturas do rock.

Do folk, passando pelo glam-rock, soul, kraut-rock, new-wave, pós-punk, eletrônica, até chegar a um tipo obscuro de jazz, Bowie não carrega o apelido de Camaleão do Rock à toa.

Vale a pena se aventurar em todas as suas fases mas, para quem ainda não é escolado em Bowie, deixo aqui 5 discos representativos das suas muitas mudanças. Eles servem como guia para assimilar a inventividade do músico britânico. Boa viagem!

The Rise and Fall of Ziggy Stardust and The Spiders From Mars (1972)

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O disco responsável pelo estrelato de David Bowie é repleto de músicas memoráveis – já começando pela primeira faixa, “Five Years”, passando pelo estouro de “Starman” até chegar ao impagável riff de “Ziggy Stardust”.

A história é conhecida: Bowie encarna a pele de um ET que vem para a Terra e torna-se uma estrela do rock. Ziggy, aqui, é o epíteto perfeito para as pretensões de um Bowie que buscava se desvencilhar do espectro de Marc Bolan e Lou Reed, músicos que foram influentes na primeira fase da carreira do britânico. Foi com este disco, porém, que o verdadeiro camaleão do rock passou a tomar forma.

A partir de então seguiria uma de suas fases mais excêntricas, resultando em tiros certeiros como Aladdin Sane (1973) e Diamond Dogs (1974), ambos carregados pelo peso de Ziggy nas costas.

Low (1977)

Já desfrutando o estrelato, David Bowie mergulhou-se numa vida de excessos, regado a muita cocaína. A partir de Station to Station (1976), entra em cena um músico obscuro, com traços de ocultismo. Segundo seu biógrafo, Marc Spitz, esta foi a fase em que Bowie mais cheirou cocaína e acabou passando por lapsos criativos.

Em busca de novos ares, juntou-se ao produtor Brian Eno, que o levou à Alemanha para testemunhar de perto a criatividade do kraut-rock. E, inaugurando a fase que ficaria conhecida como a Trilogia de Berlim, surgiu Low, com uma proposta totalmente diferente do que ele apresentara até então.

Menos pontes vocais, mais estranhas repetições de riffs e um flerte esquizofrênico com a música eletrônica, que começava a florescer. O que Bowie nos oferece em canções como “Sound and Vision”, “What in the World” ou “Be My Wife” seria a reconfiguração do rock no universo pop. Não à toa, até hoje Low é considerado um de seus álbuns mais desafiadores e criativos.

Let’s Dance (1983)

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David Bowie em 1983

Embora muito comentada, a fase new-wave de David Bowie praticamente se restringe a Let’s Dance. Entre o rock frenético de Scary Monsters (And Super Creeps) (1980) e o pós-punk de Tonight (1984), este disco representa a expansão total da estética soul-music que vinha agradando o músico desde Young Americans (1975).

Faltava ao Camaleão o appeal sonoro e a expertise em arranjos, que se materializa na excelente produção de Nile Rodgers. Vale lembrar que não foi uma transição fácil: afinal, foram 3 anos de hiato para que o músico entregasse hits impagáveis já nas três primeiras faixas do álbum: “Modern Love”, a versão “oriental” de “China Girl” e a viciante faixa-título, cuja versão estendida é de uma excelência instrumental raramente atingida por Bowie novamente. Não esqueçamos também “Cat People (Putting On Fire)”, espertamente retomada em um dos momentos mais empolgantes do filme Bastardos Inglórios, de Quentin Tarantino.

Black Tie White Noise (1992)

Apesar do sucesso de Let’s Dance, os anos 1980 foram cruéis para os fãs de Bowie. Sua incursão no pós-punk e R&B acabou se tornando um tiro no pé. Para voltar ao clássico rock’n roll, formou a Tin Machine, com a intenção de voltar às bases. Já nos anos 1990, ele fez de todas suas explorações um novo amálgama. Sua música tinha industrial, funk, eletrônica, rock… Em busca desse novo frescor, o disco Black Tie White Noise foi a prova de que Bowie levava a sério o termo versatilidade.

O disco começa com um jazz elegíaco em “The Wedding”, propõe um novo swing para “I Feel Free” (Cream), um techno esquizofrênico para “Nite Flights” (The Walker Brothers) e uma interessante abordagem meio “love songbook” para “Don’t Let Me Down and Down”. É a prova de que músico não precisaria se autorreciclar para mostrar-se relevante mais uma vez.

Blackstar (2016)

O álbum derradeiro de Bowie espantou a todos por três motivos: 1) por ser a revelação de sua batalha contra um câncer e o prenúncio da morte iminente, mostrado no impactante clipe de “Lazarus”; 2) por seguir uma linha dark-jazzística, como jamais tinha feito em sua carreira; e 3) provar que, sim, Bowie deixou o melhor para o final.

As 7 faixas de Blackstar têm o peso de uma sabedoria ímpar. Mais uma vez testemunhamos Bowie brincar com sua representatividade artística, indo de encontro a um novo mundo (como diz a faixa-título, uma viagem a outra dimensão) e explorando texturas sonoras que impõem um novo desafio à estética do rock.

Ouça “Sue (Or in a Season of Crime)” e perceba o que é multidimensionamento musical. Ou “Dollar Days”, seu adeus definitivo com excepcional cortina de sax, baixo e piano. Aqui, Bowie deixa claro que tentou bastante, mas que estava morrendo. Assim que o disco saiu, poucos entenderam a mensagem. Uma semana depois de lançar Blackstar, um triste fato explicaria: Bowie viria a falecer e o mundo perderia um dos maiores músicos pop de todos os tempos.

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Tiago Ferreira
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Editor responsável do Na Mira do Groove, fã de jazz, hip hop, samba, rock, enfim, música urbana em geral.