Jean Django Reinhardt nasceu no ano de 1910 em uma pequena cidade belga, em meio a um acampamento cigano – assim como todos os seus familiares. Embora a música fizesse parte de sua comunidade, nada indicava que ali cresceria um dos principais nomes daquilo que o jazz manouche viria a ser. Mesmo enfrentando algumas tempestades na vida pessoal e tendo morrido cedo demais, Django Reinhardt conseguiu ter seu lugar ao sol, destacando-se no mundo do jazz e espalhando a música cigana pelo mundo, como nunca fora antes dele.
Vida Pessoal
Com cinco anos, seu pai deixou a família e sua mãe teve que cuidar de Django e mais outros dois filhos: Joseph e Sara. Em 1920, mudaram-se para Paris. Django Reinhardt passou grande parte de sua vida em acampamentos itinerantes, mas a capital francesa foi a cidade onde se fixou e desenvolveu sua carreira musical.
Aos doze anos já demonstrava interesse e facilidade para aprender a música. Nesta época recebeu de um vizinho um banjo, e passou a fazer parte de uma comunidade musical – ele aprendeu um pouco de piano, violino e outros instrumentos, além do banjo. Ainda adolescente já frequentava os inferninhos de Paris apresentando-se com seu violino por nada mais que alguns trocados. Já era um músico profissional, afinal. Mas os ciganos e seu jazz manouche ainda não eram bem-vindos em alguns locais mais finos da capital francesa, como em grande parte da Europa.
Após já estar dominando alguns instrumentos, começa sua trajetória com o acordeonista italiano Vétese Guérino numa casa de dança, tocou também com Jean Vaissade e o suíço Fredo Gardoni. Até então seu universo musical era restrito à música europeia, com forte acento espanhol, o violão (guitarra) já era seu instrumento pricipal. O interesse pelo jazz surgiu aos 16 anos, assim como a influência de compositores como Claude Debussy, Maurice Ravel ou Igor Stravinsky. O músico, analfabeto e sem uma educação musical formal, beneficiava-se de uma aguda percepção sensorial.
Sua primeira gravação foi lançada em junho de 1928, ao lado do acordeonista Jean Vaissade, e Django recebeu quinhentos francos pela produção. Em outubro do mesmo ano, com o também acordeonista francês Victor Marceau, tocou banjo e assinou as gravações como “Jangot”.
Acidente e parcerias
No dia 2 de novembro de 1928, Django morava em uma carroça – uma típica residência cigana. Durante a noite, um incêndio destruiu a casa e por pouco não matou o músico e sua esposa, Florine. O casal escapou, mas Django sofreu diversas queimaduras graves.
O artista correu o risco de ver a sua perna direita amputada, a recuperação levou dezoito meses. Infelizmente seus dedos anelar e mindinho da mão esquerda ficaram deformados e paralisados para sempre, e Django teria que reaprender a tocar sem utilizar estes dois dedos, uma situação nada animadora para um músico semidesconhecido até então. É verdade que eventualmente ele usaria estes dedos para certas digitações, forçando-os um pouco, mas ter a metade dos dedos utilizados na digitação prejudicados foi uma verdadeira tragédia para quem ganhava a vida como músico. Mas também foi o início da fase de maior sucesso de Django Reinhardt e do jazz manouche.
Com uma interpretação vibrante, e com identidade muito particular na maneira de tocar, resultado da adaptação à limitação física, passou a ter um estilo único e diferenciado. Django não apenas encontrou um modo de tocar, como também desenvolveu suas habilidades a níveis mais altos do que no período anterior ao incêndio – baseado em intensidade e inventividade mais do que em técnica pura. Suas interpretações de forte acento espanhol já faziam sucesso nos bares e salões dos hotéis parisienses nesta época.
Em 1933 Django criou o lendário Quintette du Hot Club de France, com alguns amigos músicos, incluindo seu próprio irmão – Joseph, também na guitarra – e o violinista Stéphane Grappelli, seus mais célebres parceiros. O sucesso foi grande e logo resultou em um contrato com a gravadora Ultraphone. O grupo logo viria a lançar as gravações I Saw Stars, Lady Be Good, Tiger Rag e Dinah, entre outras.
Em março de 1935, novas músicas foram gravadas: “Lily Belle May June”, “Sweet Sue, Just You”, “Confessin’”, “The Continental” e “Djangology”, um de seus maiores sucessos.
Após a Segunda Guerra Mundial Django viajou para os EUA, onde já era reconhecido como um grande guitarrista – seus discos já haviam atravessado o Atlântico e espalhado o Gypsy Jazz pela América. Lá o guitarrista tocou com a orquestra de Duke Ellington em turnê de enorme sucesso. Foi nesta época que Django Reinhardt empunhou pela primeira vez uma guitarra elétrica, influenciado pelos jazzistas. Mas ele também foi o primeiro músico europeu contemporâneo dos mestres do jazz que exerceu influência sobre os músicos americanos, e no mundo inteiro o jazz manouche se fez ouvir.
Final
O músico cigano, parcialmente deformado por um incêndio, havia conquistado um improvável sucesso internacional. Ainda assim, morava em uma simples carroça, assim como todas as gerações de sua família. Django ganhava e gastava dinheiro com facilidade – jogo, bebida e mulheres eram seus vícios.
Sua performance era impressionante, mas seu talento para composição também merece destaque, em especial nas músicas lentas, quando podia expressar sua alma cigana. Ouça Douce Ambiance ou Nuages como bons exemplos.
Aos 43 anos, em 1953, o belga foi vítima de uma hemorragia cerebral e, devido à demora de atendimento médico, faleceu em Fontainebleau, cidade onde vivia.
Irreverente e com um potencial musical gigantesco, Django Reinhardt foi um dos mais influentes artistas da história do jazz, e não apenas do jazz manouche.
O legado de Django Reinhardt continua a influenciar quem queira ouvir boa música sem preconceitos.
Gostou de conhecer a história de Django? No Brasil o Jazz Cigano não é tão popular, mas conta com fiéis seguidores e até mesmo festivais, como o de Piracicaba. Saiba mais em https://www.facebook.com/festivaldejazzmanouche/
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Ótimo resumo da vida do mestre!
Grande Mauro Albert! Para quem não souber, uma das maiores referências do Jazz Manouche do Brasil (e além mar), visitem o site dele. Obrigado pelo comentário gentil. Abs. Felipe.