História do Violão: aspectos acústicos, estruturais e históricos

Conheça o violão por dentro, sua estrutura e evolução histórica.

Violão Antigo
Violões (c.1695-1699) by Jean Baptiste Voboam e Joachim Tielke, National Museum of American History

O violão é um instrumento musical da família dos cordófonos que possui seis ordens de cordas simples, cujo corpo acústico lembra o formato de número oito. A história do violão como o conhecemos data de alguns séculos, a referência mais antiga a uma guitarra de seis cordas aparece em um anúncio de venda de um jornal de Madri do ano de 1760, mencionada como vihuela, palavra usada como sinônimo de guitarra na linguagem espanhola do século XVII em diante.

Este artigo se baseia no trabalho de Eduardo de Lima Visconti para nos levar pela história do violão, do início até os dias atuais.

Em tradução livre, o anúncio do Diario noticioso universal de 3 de junho de 1760, nos traz o seguinte:

“Na rua de Atocha, casa do Granadino, vende-se uma vihuela com 6 ordens, feita por suas próprias mãos, boa para acompanhamento…”

A guitarra mais antiga, com mais de cinco ordens simples que ainda se mantém preservada, é a de Francisco Sanguineo, que foi construída em Sevilha, Espanha, no ano de 1759. Uma vez que este instrumento foi modificado, não se pode afirmar o seu número exato de cordas, porém sabe-se que eram no mínimo seis. Esse antepassado do violão possuía um comprimento de corda vibrante de 670mm e, uma estrutura interna no seu tampo, em forma de um leque harmônico simples, o qual era constituído por três barras de madeira dispostas longitudinalmente.

Em 1832, Louis Panormo construiu um instrumento muito próximo ao que conhecemos hoje como violão clássico, embora seja menor e tenha uma cintura mais acentuada. Em 1859, o luthier espanhol Antonio de Torres Jurado criou o instrumento que atualmente acabou definindo a história do violão e tornou-se o violão clássico. As principais modificações introduzidas por Torres foram: aumento do tamanho da caixa acústica, modificações das proporções, modificações do reforço interno do tampo em forma de leque (com sete barras longitudinais dispostas simetricamente) e a definição do comprimento de escala em 650 mm.

Essa combinação de modificações fez o violão ganhar mais adeptos, tendo em vista que a sua capacidade de projeção sonora aumentou consideravelmente, o que fez com que o instrumento “Torres” passasse a ser considerado o modelo padrão do violão moderno. No entanto, como se nota, a pergunta “quem inventou o violão” não tem uma resposta, uma vez que o desenvolvimento do instrumento foi cumulativo.

Mesmo o violão sendo um instrumento amplamente inserido na cultura musical brasileira, apenas algumas obras discutem a sua importância na identidade e cultura nacional. Este artigo, também não vai abarcar todas as abordagens ou temáticas envolvendo física e ensino através do violão, mas dará ao leitor algumas outras possibilidades de conhecer o funcionamento do violão, através de uma descrição do instrumento a partir da Física e da Luteria combinadas.

Estrutura do violão

O instrumento possui seis ordens de cordas simples com comprimento acústico de 65cm entre a pestana e o rastilho, afinadas geralmente nas notas mi2, 2, 3, sol3, si3 e mi4 com frequências de 82 Hz, 110 Hz, 147 Hz, 196 Hz, 247 Hz e 330 Hz, respectivamente, usando como referência o diapasão de 440 Hz, além de outras afinações possíveis, é claro. Trata-se de um instrumento versátil pois, pela quantidade de cordas, suas notas e disposições, permite tanto a execução da melodia, da harmonia ou de ambas em peças mais elaboradas. Durante o desenvolvimento do violão algumas variações foram construídas. Ainda hoje existem algumas variantes do violão e, apesar das diferenças, o elementos constituintes destes instrumentos são os mesmos, salvo alterações e detalhes característicos de cada um.

As principais partes do violão são mostradas nas FIGURAS 1 e 2. De maneira geral, o corpo do violão transforma a onda transversal da corda em uma onda longitudinal irradiada pelo instrumento, através do ar, até o ouvinte.

Para que isso ocorra, são necessárias inúmeras partes com funções e ações bem definidas, começando pelo elemento gerador de som: as cordas, que podem ser de nylon ou aço (podendo ocorrer somente com cordas de nylon ou de aço, ou ainda, ambas em conjunto em um mesmo instrumento), que aplicam uma tensão considerável no instrumento, mais de 500N (equivalente a quase 51Kgf).

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Figura 1: Visão explodida do violão sem as cordas. As partes indicadas são: 1 fundo, 2 laterais, 3 tampo, 4 cavalete, 5 rastilho, 6 pestana, 7 mão, 8 braço, 9 escala, 10 salto e 11 boca.
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Figura 2: Visão da estrutura interna do violão na ausência do tampo, fundo e laterais. As partes indicadas são: 1 taco, 2 barras transversais, 3 barras longitudinais, 4 estrutura de barras do fundo, 5 contracavalete, 6 contrafaixa e 7 barras de fechamento. O leque da estrutura em questão é o modelo Torres.

O comprimento vibrante das cordas é definido pela distância entre a pestana e o rastilho, que são duas pequenas barras, feitas geralmente de marfim, osso ou polímeros sintéticos.

A pestana se localiza no braço do violão e possui pequenos canais para o assentamento e distribuição uniforme das cordas na largura da escala, já o rastilho encontra-se no cavalete e possui uma forma geométrica complexa, permitindo que algumas cordas tenham maior ou menor comprimento, visando garantir a afinação das diversas notas tocadas em cada corda.

O rastilho também é responsável pela transmissão da vibração das cordas para o cavalete, que consiste de uma peça de madeira colada sobre o tampo e tem por função suportar o rastilho, atuar na transmissão da vibração das cordas para o tampo e sustentá-las. Geralmente o cavalete é confeccionado em diferentes tipos de jacarandá, como o da Bahia e o indiano (Dalbergia nigra e Dalbergia latifolia).

A ligação entre o corpo e a mão do instrumento é feita pelo braço, ambos geralmente são confeccionado com madeiras como o cedro rosa, maple ou, mogno (Swietenia macrophylla). Uma outra função desta parte do violão é sustentar a escala, parte esta que consiste de uma faixa de madeira dura e densa como o ébano, jacarandá ou pau-ferro, colada sobre o braço, na qual são fixados os trastes e onde se faz a digitação das notas.

Os trastes, que são filetes de metal fixados na escala, tem a função de possibilitar ao músico a digitação das notas através de intervalos bem definidos .

O formato de número oito do corpo do violão é dado através das laterais, ou faixas, que possuem uma curvatura, obtida pelo luthier através do uso de calor e umidade. Como as laterais são pouco espessas (1,6mm – 1,8mm), são utilizadas faixas de madeira, eventualmente serrilhadas, para aumentar a área de colagem entre as laterais e o fundo e as laterais e o tampo, às quais dá-se o nome de contrafaixas. Da mesma forma, os tacos internos, localizados nas emendas das laterais (taco superior para o que fica próximo a junção com o braço e inferior para o que fica na extremidade oposta), visam oferecer maior resistência e robustez ao instrumento e, aumentar a área de colagem entre as laterais.

O salto, ou tróculo, é a continuidade do braço possibilita a fixação dele ao corpo, ampliando também a área de colagem com a parte das laterais em que entra em contato. Em um instrumento com um salto do tipo espanhol, o taco interno superior, o salto e braço são uma só peça, onde as laterais se encaixam.

Os frisos e filetes são tiras e lâminas de madeiras diversas, que contornam o instrumento, acompanhando o formato do corpo, além de serem elementos decorativos, eles destinam-se a proteger o instrumento de impactos mecânicos, em uma região onde choques podem levar a formação de amplas rachaduras na direção da fibra da madeira. Além de madeiras diversas, os frisos podem conter adornos em madrepérola, marfim ou osso.

No tampo do instrumento existe uma abertura circular, denominada de boca, que tem a função de acoplar o ar do interior do corpo do instrumento com o meio externo, ela é também responsável por parte da irradiação de som do instrumento, conforme vai ser descrito na seção que trata do ressonador de Helmholz e o violão.

Ao redor da boca encontra-se um ornamento, denominado roseta, o qual como os frisos também possui função de promover reforço mecânico em uma região naturalmente mais frágil do instrumento. A roseta e o formato da mão são os elementos do violão onde o luthier possui mais liberdade para a criação artística.

O tampo do violão, tipicamente confeccionado em abeto (Picea excelsa, Picea sitchense, Picea engelmannii), é uma das partes mais importantes no processo de irradiação de som no instrumento. Como o cavalete encontra-se acoplado ao tampo através de colagem, o último acaba por ser o elemento responsável pela sustentação de toda a tensão promovida pelas cordas, distribuindo-a pelas demais partes do corpo. Assim, faz-se necessária uma estrutura interna de barras harmônicas que promove o reforço estrutural do tampo – o qual possui em média 5mm de espessura – e também alterações mecânicas na flexibilidade do mesmo, as quais compõem, juntas a outras partes, a estrutura do leque harmônico.

Já o fundo do violão, fecha a caixa de ressonância, delimitando o volume de ar contido dentro do instrumento, atuando também na reflexão de ondas sonoras no interior da caixa, tendo papel na projeção do som. Geralmente é construído a partir de jacarandá, maple, mogno e cipreste (Cupressus macrocarpa).

As travessas são estruturas coladas ao fundo do instrumento, com a função de promover reforço estrutural e manter a curvatura do fundo, sendo geralmente de abeto, cedro rosa ou mogno.

A história do violão através da evolução do Leque Harmônico

A área do tampo do instrumento onde se assenta o cavalete funciona como um diafragma durante a emissão de som pelo violão. Para suportar a tensão exercida pelas cordas e minimizar as eventuais deformações devido a variações climáticas, existe o leque harmônico, que é um conjunto de barras coladas no lado interno do tampo, conforme mostra a figura 2.

Sendo o tampo solto considerado um oscilador, o número, frequência, forma e amplitude dos modos normais criados, depende primariamente das propriedades elásticas do material, da forma, massa, espessura, rigidez e, atenuação do som. As barras modificam principalmente os valores de massa e rigidez, o que altera as propriedades elásticas do tampo e, consequentemente o regime de oscilação.

A estrutura do tampo de um violão deve ter um equilíbrio entre flexibilidade e rigidez. O tampo deve ser reforçado o bastante para resistir à tensão sem grandes deformações e continuar flexível o bastante para responder as vibrações transmitidas pelas cordas.

A parte mais importante do leque é constituída pelo arranjo de uma série de barras longitudinais normalmente dispostas em forma de leque (divergindo a partir da cintura do instrumento), existem ainda duas ou três barras conhecidas como barras harmônicas ou travessas que atravessam o tampo no sentido transversal acima e logo abaixo da boca.

Nesta parte são apresentadas as principais características encontradas na maioria dos leques harmônicos de violão. Algumas outras abordagens podem agrupar estas propriedades de maneira diferente, mas, para efeitos deste artigo, este será o conjunto de características consideradas mais importantes. A nomenclatura foi adaptada do trabalho do luthier Daniel Friederich e é uma boa maneira de analisarmos a história do violão e seu desenvolvimento.

Aberto/fechado: Alguns leques possuem duas barras diagonais que lembram o formato da letra V ao final das barras longitudinais, estes leques são denominados fechados. Aqueles que não possuem estas barras são abertos.

Assimétrico/dissimétrico/simétrico: O leque simétrico é completamente idêntico em ambos os lados do tampo. O leque dissimétrico possui simetria visual, porém apresenta diferenças, por exemplo, na altura das barras. O leque assimétrico apresenta diferenças na disposição das barras ao compararmos as metades do tampo.

Inteiro/quebrado: o leque inteiro tem as suas barras longitudinais percorrendo a superfície abaixo do cavalete, passando pelo contracavalete (se houver). No leque quebrado as barras são interrompidas ao passarem pela área onde se assenta o cavalete.

Em forma de leque/Em forma de X/ Em disposição radial: Em forma de leque quando as barras têm seu inicio logo abaixo da cintura do instrumento e divergem a medida que se aproximam da extremidade do tampo. Em forma de X quando existem duas barras que se cruzam logo abaixo da boca do instrumento. Em disposição radial quando as barras partem de uma barra transversal localizada abaixo do cavalete.

Barras: Podem apresentar a seção transversal semicircular, quadrada, retangular, triangular e retangular alta com desbastes nas extremidades. Com relação ao perfil da barra como um todo, pode ser em forma de arco, reta com entalhes nas extremidades ou ainda, reta com entalhes ou furos na extremidades e no corpo.

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Figura 3: Linha do tempo dos principais leques harmônicos de violão iniciando em 1759 com o leque criado por Francisco Sanguineo até os anos 1980 com a variante do leque de Michael Kasha criada pela luthière Gila Eban.

Leque Transversal: Nos violões primitivos, o tampo era reforçado com algumas barras apenas no sentido transversal, adaptadas dos sistemas comumente utilizados em alaúdes, estas barras eram dispostas em linha reta ou ligeiramente anguladas. Esse sistema não é mais utilizado.

Francisco Sanguineo: de Francisco Sanguineo (c. 1750), luthier. Leque simétrico, com 3 barras longitudinais.

Leque em X: de Christian Friedrich Martin (1796 – 1873), luthier. Leque assimétrico em forma de X desenvolvido por volta da mesma época em que Torres criava o seu sistema. Surgiu décadas antes das cordas de aço, porém por se adequar as necessidades dos violões de aço, que suportam uma maior tensão, é mais utilizado nestes instrumentos. Possui contracavalete.

Torres: de Antonio de Torres Jurado (1817 – 1892), luthier. Leque simétrico, fechado, com 7 barras longitudinais. Nos primeiros violões as barras tinham a seção transversal no formato triangular, depois passaram a ser arredondadas.

Hernandez: de Santos Hernandez (1874 – 1943), luthier. Leque simétrico, aberto, com 7 barras longitudinais.

Hauser: de Hermann Hauser I (1882 – 1952), luthier. Leque simétrico, fechado, com 7 barras longitudinais. Possui contracavalete.

Fleta: de Ignacio Fleta (1897 – 1977), luthier. Leque assimétrico, fechado, com 9 barras longitudinais, 2 barras centrais, 1 barra em 90º e, 1 barra inclinada. Tampo mais espesso na área do cavalete, possui contracavalete.

Bouchet: de Robert Bouchet (1898 – 1986), luthier. Leque dissimétrico, aberto, com 5 barras longitudinais, 1 barra transversal na área do cavalete, 1 barra central com aberturas que permitem que as barras longitudinais se estendam até o reforço da boca. Apresenta tampo curvo.

Ramirez: de José Ramírez III (1922 – 1995), luthier. Leque assimétrico, fechado, com 6 barras longitudinais, sendo 1 barra central, 3 no lado das cordas graves e duas no lado das agudas, 1 barra central em 90º e 1 barra inclinada. Possui contracavalete.

Hernández y Aguado: de Manuel Hernández (1895 – 1975), luthier e Victoriano Aguado (1897 – 1982), luthier. Leque assimétrico, fechado, com 6 barras longitudinais, meia barra diagonal no lado das cordas agudas. Possui contracavalete.

Kohno: de Masaru Kohno (1926 – 1998), luthier. Leque assimétrico, fechado, 6 barras longitudinais, 3 do lado agudo, 1 central e 2 do lado grave. Possui 5 barras transversais e também contracavalete.

Lattice: de Greg Smallman (19?? -), luthier. Leque simétrico, possui barras reforçadas com fibra de carbono, proporcionando a redução da espessura do tampo.

Kasha: de Michael Kasha, (1920 – 2013), físico-químico. Foi desenvolvido em colaboração com Richard L. Schneider (1936 – 1997), luthier. Leque assimétrico, radial, 1 barra transversal na área do cavalete, barras curvas. Possui um número muito maior de barras do que sistemas derivados de Torres, sendo estas mais curtas. Formato especial de cavalete adaptado ao leque.

Friederich: de Daniel Friederich (1932 -), luthier. Leque simétrico, fechado, com 7 barras longitudinais. Possui uma barra transversal na região do cavalete.

Romanillos: de Jose Romanillos (1932 -), luthier. Leque simétrico, parcialmente aberto, com 7 barras longitudinais e 4 barras menores ao lado da boca. Barras transversais com aberturas que permitem a passagem das barras longitudinais.

Do violão para a guitarra elétrica

Uma das primeiras tentativas de “amplificação” do som de instrumentos de corda foi a de Augustus Stroh, que em 1900 usou no violino um sistema semelhante ao do gramofone, figura 4. O cavalete do instrumento excita uma membrana que produz o som, e é projetado por uma corneta.

Esse sistema apesar de ter sido mais popular em violinos foi usado em outros instrumentos da mesma família e, até mesmo chegou a violões e bandolins.

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Figura 4: Desenho da patente Nº 644,695 do violino criado por J. M. A. Stroh em 1900. As partes indicadas com letras latinas minúsculas são as responsáveis pela transmissão do som da corda, passando pelo cavalete e pelo diafragma até a emissão pela corneta, denotada por h .

Antes da invenção dos microfones e do sistema de gravação elétrico, a gravação de sons era mecânica. A música era tocada próxima a uma corneta que possuía uma membrana flexível, na qual estava presa uma agulha que imprimia as vibrações produzidas pelo som em um disco de cera. Esse método limitava os sons que podiam ser registrados entre 350 Hz até 3000 Hz.

Os instrumentos de Stroh foram amplamente usados na indústria fonográfica na primeira metade do séc. XX, uma vez que produziam som direcional, facilitando o processo de gravação mecânica, porém tornaram-se obsoletos junto com o sistema de gravação mecânica quando a gravação elétrica foi inventada.

No começo do séc. XX nos Estados Unidos, o violão já estava consolidado no meio musical, com as guitarras archtop e os violões de cordas de aço. Porém, na composição das bandas de salão da época esses instrumentos não eram considerados muito importantes. Em meio a instrumentos de sopro, de arco, o piano e a percussão, seu som era quase inaudível.

Outros instrumentos de corda como o banjo e o bandolim conseguiam se sobressair melhor nesse contexto, sendo usados para melodias e o violão se restringia à parte rítmica.

Assim, naquele contexto, provavelmente só se ouvia o violão estando próximo ao palco ou em momentos em que o instrumento fazia solos e a banda diminuía sua dinâmica para que o solo pudesse ser escutado. Tentando resolver esse problema surgiram algumas propostas para a melhoria da projeção/irradiação sonora do instrumento.

Uma das primeiras soluções foi a criação dos violões resonators, que possuíam cones que irradiavam som a partir da vibração vinda direto do cavalete, de maneira similar a um gramofone, cujos primeiros exemplares foram produzidos em 1927 em uma colaboração de George Beauchamp, Jonh Depyera e Adolph Rickenbacker.

Dado o problema exposto e a baixa eficiência dos sistemas mecânicos de “amplificação”, surgiu a necessidade de que a abordagem adotada mudasse. Nisso surge o conceito de captador magnético, o qual é um transdutor, ou seja, um elemento que converte um tipo de sinal em outro tipo de sinal.

No caso dos instrumentos de corda como o violão, a guitarra e o baixo elétrico, transformam parte da vibração da corda do instrumento em um sinal elétrico. Dentre as primeiras tentativas de captação usando a indução magnética encontra-se o captador horseshoe, apresentado em um instrumento criado por Rickenbacker, conhecido como frying pan por possuir uma certa semelhança a uma frigideira.

Como o captador geralmente era preso ao tampo de um instrumento acústico, um dos lugares com a maior amplitude de movimento da vibração do instrumento, consequentemente vibrava junto ao tampo, criando assim uma frequência aguda, que era amplificada pelo alto falante e alimentava a vibração do corpo, gerando o que é conhecido por microfonia acústica, problema que foi resolvido mais tarde com a utilização de um corpo sólido.

Apenas no final da década de 1940, primeira guitarra de corpo sólido foi colocada no mercado por Leo Fender, a Broadcaster, que depois mudou seu nome para Telecaster, assim chegando aos modelos de guitarras conhecidos atualmente. Leo Fender tornou-se um nome icônico na história do violão e, principalmente, da guitarra elétrica.

O conceito mais simples de um captador magnético consiste de um ou mais ímãs com uma bobina formada por N espiras enroladas ao seu redor. No caso do captador da guitarra elétrica Telecaster, são seis pólos de alnico (liga metálica composta primariamente por Al, Ni e Co) e uma bobina com cerca de 7800 a 9000 espiras de fio esmaltado, geralmente de bitola AWG 42. Próximo a estes, está uma corda de material ferromagnético, que é magnetizada pela presença do ímã. Quando a corda é colocada em movimento, passa a perturbar o campo magnético nas proximidades da bobina, gerando nessa uma corrente elétrica induzida.

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Tipos de captador

A forma mais simples que um captador magnético pode ter, é composta de apenas uma bobina, por isso chamado de single coil em inglês, com um núcleo magnético. Este pode ter diversos tamanhos e formatos, sendo o mais comum com seis polos magnéticos, posicionados em baixo de cada uma das cordas, como mostrado na figura 5. Todos os ímãs tem a mesma orientação e o polo sul é virado pra cima, ficando mais próximo da corda. Os modelos mais conhecidos são os single coils das guitarras Stratocaster e Telecaster da marca Fender e o P-90 da marca Gibson.

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Figura 5: Visão explodida de um captador magnético do tipo single coil à esquerda e de um captador magnético do tipo humbucker à direita. As partes identificadas na figura são: 1 ímãs, 2 bobina(s) e 3 capa. Toda a estrutura do captador é montada sobre uma base na sua parte inferior.

Um problema comum em captadores é que eles funcionam como uma antena e sofrem interferência de campos magnéticos externos ao instrumento. Em sons diretos do instrumento e sem efeitos de drive ou boost a relação de sinal/ruído é boa, mas quando efeitos passam a estar presentes, esta relação já não é mais satisfatória devido ao destaque do ruído em relação ao sinal. Visando encontrar uma solução para esse problema, o captador humbucker foi criado por Seth Lover e Walter Fuller na década de 1950. Este consiste em duas bobinas lado a lado, conforme a figura 5, enroladas cada qual em um sentido (horário e anti-horário).

Essa montagem faz com que a corrente elétrica induzida nas diferentes bobinas por uma variação de campo magnético externo possua fases opostas, de maneira que a soma dos sinas de cada bobina seja muito próxima de zero. Para que o sinal produzido pelo movimento das cordas também não se anule, os ímãs de cada bobina são invertidos, ou seja, enquanto a parte superior (mais próxima das cordas) de todos os ímãs de uma bobina é polo norte na outra bobina, são todos polo sul, de maneira que o sinal resultante é mais intenso do que o sinal de uma bobina individual.

O fato do humbucker possuir duas bobinas uma do lado da outra faz com os ímãs do captador produzam um campo magnético mais intenso e também mais extenso espacialmente que os captadores de uma bobina, permitindo captar uma porção maior da corda vibrante.

Isso faz com que capte melhor as ondas de frequência mais baixa, pois possuem maior comprimento de onda, deixando assim com harmônicos graves mais intensos, gerando um som característico e distinto do som de um captador de uma bobina.

A existência de duas bobinas também permite que sejam exploradas as ligações entre elas, podendo ser ligadas em série ou em paralelo, interferindo de maneira distinta no comportamento do captador e no resultado sonoro final.

De maneira bastante simplificada, quando ligadas em série a resistência resultante será a soma das resistências individuais, resultando em um som mais intenso, caracterizado pela presença baixas frequências (sons graves), perda nas frequências altas (sons agudos) e, uma boa relação sinal/ruído. Já na ligação em paralelo, a resistência resultante é a metade da soma das resistências individuais de cada bobina, criando um som consideravelmente menos intenso, com maior presença de altas frequências (sons agudos), e uma pior relação sinal/ruído.

Uma outra arquitetura possível é a do captador stacked humbucker, que são captadores com duas bobinas empilhadas, ou seja, uma em cima da outra. A bobina situada na parte de cima – mais próxima das cordas – é a principal responsável pela captação e, a bobina que fica em baixo, cujo enrolamento e orientação dos polos dos ímãs estão em sentido inverso a da superior, tem a finalidade de eliminar parte do ruído como em um captador humbucker.


Artigo baseado no trabalho original de Monicky E. Zaczéski em coautoria com o prof Dr. Thiago Correa de Freitas.

Licença Creative Commons
Este trabalho está licenciado com uma Licença Creative Commons – Atribuição 4.0 Internacional.

2 COMENTÁRIOS

  1. A referência do artigo está errada, esse trabalho é meu em coautoria com o Prof. Dr. Thiago de Freitas

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