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Há alguns anos, tive o enorme prazer de ser o guitarrista residente em uma cadeia de hotéis às margens do Mediterrâneo, no sul da Espanha. A tarefa era simples, tive que ambientar musicalmente os restaurantes da organização.

Minhas apresentações podiam ser bem cedo no café da manhã, à tarde ou à noite, numa responsabilidade compartilhada com dois pianistas, também residentes do lugar, e uma variedade de músicos convidados, entre cantores, duos ou trios.

No meu caso, oferecia um estilo instrumental “chill out” de guitarra solo, cuja intenção e intensidade tinha que se adaptar dependendo da natureza do lugar e da ocasião. No caso das manhãs, meu equipamento consistia de um violão clássico com um iPad, amplificados por meio de um pequeno mixer e um alto-falante ativo. Deveria tocar em meio a um grande café da manhã de negócios, onde havia agentes comerciais e seus convidados.

Durante um set de aproximadamente duas horas, dividi meu repertório basicamente em duas fases. Na primeira, interpretei músicas com a técnica ‘fingerstyle‘, ou seja, tocando melodia e harmonia ao mesmo tempo, como um piano normalmente faz. A segunda fase do repertório incorporou um acompanhamento com faixas (backing tracks) e passei a tocar as melodias e uma ou outra improvisação.

À tarde e à noite meu equipamento era o mesmo, exceto que eu usava uma guitarra elétrica com um pequeno multi-efeitos para conseguir uma boa adaptação a cada música. Neste caso, prevaleceram os temas utilizando faixas de backing tracks, embora ocasionalmente houvesse alguns temas ‘fingerstyle‘.

Há muitas coisas que devem ser levadas em consideração neste tipo de trabalho como guitarrista. Deixo a seguir alguns pontos muito importantes, que foram muito úteis e que desenvolvi durante essa maravilhosa experiência:

  • É muito útil desenvolver uma sensibilidade para ler o ambiente local e escolher os temas para tocar e como tocar. Por exemplo, música silenciosa para facilitar a conversa ou mais animada ao anoitecer. Em outras palavras, deve ficar claro que não se trata de dar um concerto, mas de criar uma atmosfera correta.
  • Desenvolver boas relações com o pessoal (camareiras, gerentes, agentes comerciais), permite que você tenha feedback sobre o seu trabalho. Ao contrário dos clientes ou convidados, a equipe do local está sempre presente e pode ser muito útil para melhorar e ajustar as coisas.
  • Você precisa conhecer o público. Isso facilita a escolha do repertório certo em cada caso. Normalmente eu estava enfrentando clientes de meia idade e idosos provenientes do Reino Unido e de outras partes da Europa, que responderam positivamente a artistas pop e rock clássicos como Stevie Wonder, The Police, Michael Jackson, The Beatles, entre outros. Alternando com alguns padrões de Jazz e, claro, Tom Jobim sempre foi bem recebido. Não atrapalhou adicionar temas atuais, pois embora haja um público predominante, também há outros gostos.
  • É importante manter a motivação. Se você tem um repertório muito limitado, é muito provável que nós mesmos nos cansemos e isso influencie nosso desempenho ao tocar. É bom aumentar o número de músicas semana a semana e desenvolver o repertório com um equilíbrio entre os gostos do público e o seu. Meu estilo pessoal como guitarrista tem uma grande influência no jazz, então mais de uma vez eu peguei temas pop e rock e os fixei em um terreno muito agradável para mim.

É claro que cada lugar tem suas próprias formas e requisitos, mas espero que essa experiência pessoal seja útil e adaptável a outros músicos em situações semelhantes.


Sobre o Autor

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Carlos Severiche
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Carlos Severiche é um guitarrista colombiano que viveu muitos anos na Espanha. Ele foi colaborador de muitos artistas em diferentes estilos e liderou seu próprio projeto de jazz fusion instrumental. Ele também passa boa parte de seu tempo como professor de violão em diferentes lugares. Você pode ouvir seu álbum "Sentido Común" (2012) nas principais plataformas digitais. Siga-o no Instagram e visite o site www.carlosseveriche.com.