DJ e MC? Rap, agora, tem que ter banda!

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Desde a década de 1980, a essência do rap resumiu-se a ter um MC e um DJ – algo que moldou toda sua história e desenvolvimento desde o fim dos anos 1970, em Nova York, à consagração de duplas como Eric B & Rakim, The Fresh Prince & Jazzy Jeff – que, inclusive, tem um disco chamado He’s the DJ, I’m the Rapper (1988), prova de que o cara das picapes era visto como o líder.


He’s the DJ, I’m the Rapper (1988)

Essa dinâmica mudou entre o fim dos anos 1980 e início dos 90, principalmente quando os MCs passaram a falar dos problemas sociais em torno de suas comunidades.

Assim, naturalmente, o MC passou a ficar em primeiro plano. Isso não quer dizer que o DJ “ficou pra trás”: ele passou a atuar mais como produtor dos singles e álbuns, desempenhando um papel crucial para a construção sonora. Caras como Large Professor, J Dilla, Pete Rock são alguns dos que ajudaram a redefinir esse papel.

O rap nacional acompanhou um pouco essa dinâmica, mas, com a força das apresentações ao vivo, percebeu a importância de se ter uma banda para acompanhar. Trata-se de um fenômeno que vai além da profissionalização do hip hop. Por mais que o sampler ainda seja parte importante de sua essência, muitos rappers brasileiros têm investido em shows com banda própria ou contratada. Isso tem possibilitado trabalhar arranjos de forma diferente, trazendo uma nova essência musical.

A seguir, apresento alguns dos rappers brasileiros que têm gravado discos e se apresentado com bandas.

Marcelo D2

O próprio Planet Hemp foi um ponto de partida importante para a energia do live com banda, mas foi Marcelo D2 quem explorou melhor a forma como o rap se moldaria com uma banda de apoio.

Um ponto de inflexão importante foi o Acústico MTV, de 2004, momento em que entrecruzou com músicos de diferentes expressões: do pianista João Donato ao cantor Will.i.am, do Black Eyed Peas, muitos se impressionaram com a performance do carioca.

Não podemos esquecer o time de peso que ajudou D2 a ir do hip hop ao samba neste ao vivo, como o trombonista Bocato, o vibrafonista Beto Caldas e uma talentosa sessão de cordas com violino, violoncelo, viola, cavaquinho e violões.

Criolo

O álbum Nó na Orelha (2011) ajudou a introduzir uma nova “fórmula” ao rap nacional. A produção de Daniel Ganjaman e Marcelo Cabral, que também é baixista da banda de Criolo, deu um swing mais original à proposta do rapper. Para sua turnê pelo Brasil e países da Europa, Criolo contou com o saxofonista Thiago França, o baterista Sérgio Machado e o guitarrista Guilherme Held, além da presença do MC Dan Dan, o baixista Cabral e, muitas vezes, Ganjaman dividindo os palcos.


As muitas apresentações fizeram com que Criolo moldasse sua própria forma de fazer rap. Não à toa, passou a ser cultuado por seu estilo próprio de canto – característica que o aproximou dos grandes medalhões da MPB, como Caetano Veloso, Chico Buarque e Milton Nascimento.

Desde então, todos os discos e shows de Criolo são preparados em um formato com banda de apoio. Convoque Seu Buda (2014), por exemplo, permitiu explorar novas timbragens sonoras. Já o seguinte, Espiral de Ilusão (2017), selou sua proximidade com o samba, gênero que o influencia desde a infância. Seu novo álbum deve sair em 2019 e, a julgar pelo celebrado single “Boca de Lobo”, provavelmente vai retomar a sonoridade orgânica e multiestilística dos anteriores.

Emicida

Emicida ficou bastante popular por suas batalhas de rimas. Sua primeira mixtape de sucesso foi Emicídio (2010), mas a partir da dinâmica com os produtores Beatnick e K-Salaam, em Doozicabraba e a Revolução Silenciosa (2011), o rapper mostrou que estava afim de respirar novos ares musicais.

Quando veio O Retorno Glorioso de Quem Nunca Esteve Aqui (2013), ele fez questão de estruturar um disco e uma turnê com uma banda completa. “Achei que muito do que estava escrevendo não estava me trazendo um ar de novidade. Fiquei quase um ano sem escrever pensando pra que lado levaria a minha música”, chegou a dizer ao Na Mira do Groove em uma entrevista na época. Isso fez com que assumisse um lado mais crooner das ruas – algo levado a outro patamar no disco seguinte: Sobre Crianças, Quadris, Pesadelos e Lições de Casa… (2015).

Rael

Destaque do grupo Pentágono, Rael da Rima passou a trilhar uma carreira solo flertando com várias possibilidades da música brasileira. Seu primeiro trabalho solo, MP3 – Música Popular do 3º Mundo (2010), tinha uma banda à disposição, com dois guitarristas (Bruno Dupre e Xandola), teclado (Bruno Baby), sax (Cauê Vieira), baixo (Rato Bass), bateria (Muka Batera) e toca-discos (DJ Will).

Para o disco de 2013, Ainda Bem que Segui as Batidas do Meu Coração, ele adotou somente Rael e explorou com mais arrojo ritmos como afro-beat, ragga e samba. “Sempre gostei mais de cantar do que de rimar. Meu forte sempre foi mais a melodia”, me disse Rael na época.

Trabalhar com banda e instrumentos tem sido sua proposta desde que focou na carreira solo. No ano passado, o cantor criou uma série no YouTube chamada “Rael Convida”, trazendo músicos de diferentes gêneros para um dueto no estúdio, incluindo Black Alien, Thiaguinho e Di Ferrero (NX Zero).

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LP do Rael, Coisas da Minha Imaginação

Sobre o Autor

Tiago-Ferreira
Tiago Ferreira
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Editor responsável do Na Mira do Groove, fã de jazz, hip hop, samba, rock, enfim, música urbana em geral.